Além da virtualidade.

Oi Marcio,

Conheci ontem o site de vocês e to amando, mas não vi nada sobre “relacionamento virtual”. Fiquei 9 meses nisso, me deixando enganar por um cara que era TODO mentira, até que descobri  e quando a casa caiu pra ele e o expus pra namorada ( que eu nem sonhava que existia ), claro que o meu lindo homem de 37 anos q eu me apaixonei virou o sapo moleque de 24 anos totalmente diferente do q se fez passar e do qual a imagem eu aceitei 🙁

Enfim…..gostaria de ler sua opinião sobre isso. Obrigada. R.


Olá R.,

Para falar um pouco sobre o virtual, não posso deixar de citar Pierre Lèvy, um filósofo da informação que se ocupa em estudar as interações entre a Internet e a sociedade. Ao falar do conceito, ele o aborda, em seu livro “O que é virtual”, da seguinte maneira:

“o virtual não se opõe ao real, mas sim ao actual. Contrariamente ao possível, estático e já constituído, o virtual é como o complexo problemático, o nó de tendências ou de forças que acompanha uma situação, um acontecimento, um objecto ou uma entidade qualquer, e que chama um processo de resolução: a actualização.” (LÉVY, 1996, p.16)

A virtualidade acaba possuindo diversas definições porque não se aplica somente ao campo de conhecimento da informática, mas vem sendo parte integrante das relações humanas. Quando demonstrávamos algo que não era parte da nossa pessoa ou quando nos sentíamos atraídos por uma projeção do  que queríamos sobre o outro, mas que concretamente era inexistente, ou seja, não condizia com o apresentado já era a virtualidade operando.

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No livro “O banquete” de Platão (livro dedicado ao amor e seus aspectos) , Aristófanes cita o amor como sendo uma busca pessoal pela nossa outra metade. Pensar em nossa “outra” metade é assumirmos que há algo que nos completa, que se encaixa perfeitamente. Isso não deixa se ser, além de uma idealização, uma virtualização daquilo que gostaríamos de ter e que pode nos levar à muitos sofrimentos e desencontros por não compreendermos a dinâmica do amor como sendo uma experiência, diferentemente de “colarmos” essa busca à alguém que não existe.

Mas entendo que sua questão esteja mais voltada ao virtual que o mundo digital hoje nos proporciona. Destaco um paradoxo conceitual interessante. Ao mesmo tempo em que a internet nos aproxima de outras culturas e pessoas por se tratar de um meio de comunicação que nos traz experiências praticamente que “live” (ao vivo), também nos distancia do real por possibilitar tanta liberdade que podemos ser quem quisermos, inventarmos e publicarmos o que quisermos, deixando acessível à qualquer pessoa do mundo.

Nesse arriscado e perigoso anonimato, escondem-se pessoas mal intencionadas e que buscam na rede respostas e maneiras de preencherem as lacunas de suas existências. Entende-se por lacunas traumas, carências, obsessões, uma série de fragilidades que podem ser expostas sem a menor preocupação de que alguém seja identificado. Com isso faz-se necessário unificar medidas e diretrizes que venham a nos proteger de pessoas assim, bem como proporcionar cuidado e tratamento para quem sofre de algum mal desse tipo.

A discussão é extensa, relacionar-se com alguém apenas virtualmente nos oferece um risco, de cairmos no tal “conto do vigário”, de ouvir e conhecer alguém que na verdade nos conta algo totalmente distorcido da realidade e isso com certeza acabará nos frustrando e nos colocando em uma situação muito delicada. Mesmo que não fosse no virtual, conhecer alguém é um processo, uma tentativa de estarmos juntos de alguém que nos parece legal, porque afinal de contas temos nossas motivações pessoais para querer alguém em nossa vida.

Não vejo arriscar nesse tipo de relacionamento como algo ruim, mas há de se ter o mínimo de cautela com os passos que iremos dar. Procure realmente conhecer a pessoa verdadeiramente, como através do telefone, redes sociais, até mesmo para ver se a pessoa tem amigos. Se houver um encontro real, que seja em local público e preste bem atenção como a pessoa se comporta, conversa, se olha nos olhos, se tem calma, não é insistente ou invasiva. Coisas que acho que até a mãe da gente diria ao começarmos a sair com alguém novo em nossa vida.

Você mesma mencionou que seu homem de 37 era o moleque de 24, mas convenhamos que é importante pensar que caberia uma maturidade da sua parte em não se iludir e idealizar um relacionamento ou algo bom para sua vida em alguém que você nem conhece. Porque não tem como mesmo isso acontecer, a desilusão é algo assim quase que certo, salvo algumas raras exceções. Percebe que no seu próprio texto você faz referência à algo que não existe.

Fulano foi “diferente do q se fez passar e do qual a imagem eu aceitei…”. E era apenas uma imagem. Até mesmo as pessoas que vemos na rua, que encontramos em uma balada, são imagens. A princípio as selecionamos pela imagem para depois, em uma possível conversa ou “pegada” essa imagem ir se complementando ou então se autodestruindo porque não tinha nada a ver mesmo.

Simpatizar-se e gostar de alguém virtualmente pode estar muito mais ligado ao que projetamos em uma pessoa do que algo real que pode se tornar concreto. Há de ser importante e fundamental termos cuidado com os nossos sentimentos principalmente.

Até mais!!

Márcio Oliveira

[email protected]
Meu Blog: As Palavras

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Psicólogo, consultor de relacionamentos e quase Mestre pela USP-SP. Meio NERD, completo romântico, mas não abre mão de um intenso beijo na boca e um alinhamento entre coração, corpo e mente.

6 comentários No Além da virtualidade.

  • O poeta Drummond de Andrade escreveu: “O amor foge a dicionários e a regulamentos vários”. Pois é… não existem regras para o amor. Ele pode aparecer onde menos esperamos. E por que não na internet? Presenciei situações assim de perto, não comigo, mas com pessoas próximas e que deu certo!

    Claro, como disse o Márcio e as mães, tias e amigas desconfiadas… tome cuidado!
    Não acredite tanto em perfis maravilhosos, fotos deslumbrantes, pessoas felizes e perfeitas demais. Há muita gente má intencionada por aí, mas há também pessoas muito legais afim de encontrar pessoas legais!!! =)

  • R. Você não é a única, nós temos uma mania de idealizar uma pessoa perfeita, e quando parece que é de verdade, nem sequer questionamos, apenas acreditamos….
    Você vai superar, e no fim foi bom, pois aprendeu uma lição, né?

    Beijos.

  • O mundo virtural em geral(principalmente redes sociais), é uma mentirada que só!!
    Pessoas constantemente felizes, cheias de amigos, simpáticas, relacionamentos perfeitos e muitos solteiros(as) comprometidos(as)..Affe!! Ngm merece! DESCONFIE…

  • Eu sempre tive muito medo desse negócio de sair do virtual e ir para o real. Certo dia aconteceu uma coisa bem engraçada, recebi um daqueles convites do Badoo para ver o perfil de um amigo, quando entrei na págida do dito cujo, dizia estar num relacionamento aberto, e ele é casadinho da silva, na página dizia que ele nem bebia e nem fumava e ele fuma mais que chaminé e entorna mais que cotovelo. Ai pensei se nem posso confiar num amigo que dirá naqueles que nem conheço hehehehe 😉
    Marcio texto maravilhoso como sempre!
    beijuss da sara 🙂

  • Nunca tive essa experiência… Prefiro pessoalmente, olhos nos olhos…
    Mas acredito sim que possa se iniciar algo pela internet e depois trazer isso pra realidade… só que como foi dito pelo Márcio, é necessário cuidado redobrado, pois a possibilidade de distorções é grande…
    Se o normal já é assim… explico: conheço algumas pessoas que são muito mais ‘soltas’ pela internet do que pessoalmente… não que sejam uma coisa online e outra na realidade, mas acho que durante uma conversa virtual o ‘medo’ de se expor é menor… afinal a pessoa não está te olhando (ao menos que tenham uma webcan)… então torna-se mais fácil maquiar a ‘timidez’…
    Por isso declaro a minha preferência para o ‘face to face’… hehe
    E querendo ou não voltamos àquele mesmo ponto: Não idealizar demais, não criar expectativas… e isso vale pra qualquer tipo de relação… difícil neh? Mas não é impossível.
    E voltando ao caso da leitora… da próxima vez, vc deveria conhecer melhor a pessoa… pegue todos os contatos, não se limite a uma sala de bate papo, abra a
    webcan, peça o orkut, o facebook, o telefone… e marque um encontro assim que possível pra ‘tirar a prova’ disso tudo e correr menos risco de decepções…

    bjinhos 😉

  • Antes de qualquer coisa ..Marcio adorei essa do cachorro com a pata no teclado.. poderia ser tmb a de um palhaço(..)ehehheheh…. essa foto do bjinho na tela pega einh…

    Bem, eu na verdade sempre, sempre fiquei com os dois pés atras com este negócio de conhecer qqer pessoa pela net, por medo, insegurança na verdade, a gente nunca sabe quem esta do outro lado da net..uma vez li um email, ao qual homem e mulher falavam coisas ”’picantes”’ um pro outro… coisa esquentando, marcaram, ela deu o endereço pra ele, que se assustou ao saber que com quem tc era a própria avó!!! (kkkkk)…
    O ideal é ir conhecendo aos poucos..idealizar é a pior armadilha..
    nada como vc ter a inteligência de ir percebendo o outro.. notando.. vendo como se comporta.. se suas atitudes não mudam..sempre sao as mesmas.. mesmo pela net..ir notando o que ele escreve..tem que ter coesão sempre.. se ele for verdadeiro sempre escreverá da mesma forma… nao mudará as ideias.. bruscamente…é bem importante isso.
    Na net tudo são flores, tudo perfeito, todos felizes, na vida real a coisa muda um pouco, ninguém é 100% bom ou ruim .. mas cabe a nós..saber separar e tirar algo de bom..
    Se vc vai conhecendo…’lendo” essa pessoa… observando.. admirando…
    quando um encontro acontecer…. vc vai ter que relacionar tudo que esta pessoa te disse e observa as atitudes e compara, quando tudo entra na mais perfeita sintonia, fala, atitude, ações, e principalmente nao podemos deixar de observar uma verdade nos olhos..que entra em sintonia pra que tudo torne-se dias incríveis..
    e tirar o que melhor tem de bom e quem sabe algo mais forte vai surgindo..ficando vivo .. criando laços..
    bjus

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